
Dólar tem nova disparada e fecha em recorde de R$ 6,26 com pacote fiscal e Fed
O dólar fechou em R$ 6,267 nesta quarta-feira (18), novo recorde nominal para a moeda norte-americana.
A disparada de 2,81% ocorreu em meio à tramitação do pacote de corte de gastos do governo no Congresso Nacional. A Câmara dos Deputados aprovou a primeira parte do projeto na terça, e as outras duas deverão ser analisadas no plenário nesta sessão.
Os investidores ainda analisaram a última decisão de política monetária do Fed (Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos) do ano. A autoridade optou por uma redução de 0,25 ponto na taxa de juros, agora na banda de 4,25% e 4,50%, mas projeta apenas 0,50 ponto de corte em 2025.
Ainda que o valor de R$ 6,267 seja recorde na base nominal —a que desconsidera a inflação do cálculo—, a maior cotação real foi atingida em setembro de 2002, na esteira da primeira eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Corrigido pela inflação, o valor do dólar naquela ocasião seria hoje o correspondente a R$ 8,81.
A conta, feito pela consultoria Elos Ayta, considera a cotação da Ptax —a taxa de câmbio calculada pelo BC (Banco Central)— e ajustes pela inflação brasileira (IPCA) e norte-americana (CPI) até novembro de 2024.
A Câmara aprovou, na noite de terça, o texto-base de um dos projetos do pacote de contenção de gastos do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A proposta não contempla alguns dos pontos centrais do pacote, como o limite ao ganho real do salário mínimo e as mudanças no BPC (Benefício de Prestação Continuada), mas prevê outros dispositivos relevantes, como a possibilidade de bloquear até 15% das emendas parlamentares para cumprir os limites do arcabouço fiscal.
O resultado da votação é a primeira sinalização concreta de que as medidas têm condições de avançar no Congresso Nacional. Mas, entre os agentes do mercado, ainda há preocupações de que o pacote possa não ser votado até o fim do ano ou que as propostas sejam desidratadas. Os parlamentares entram em recesso já nesta sexta-feira (20).
“Caso consigam aprovar tudo ainda em 2024, é possível que o mercado se tranquilize. Essa perspectiva apareceu na segunda metade do pregão de terça, quando, depois de uma manhã de muito estresse que levou o dólar até a R$ 6,20, os ânimos se acalmaram”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.
Além do PLP, ainda está pendente de aprovação o projeto de lei ordinária que contempla o limite ao ganho real do salário mínimo, as mudanças no BPC (pago a idosos e pessoas de baixa renda) e a alteração na regra de cálculo dos repasses ao FCDF (Fundo Constitucional do Distrito Federal), entre outras medidas.
O pacote do ministro Fernando Haddad (Fazenda) ainda inclui uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que mexe no critério de concessão do abono salarial (espécie de 14º salário pago a parte dos trabalhadores com carteira assinada) e busca extinguir de vez com os supersalários na administração pública.
Ambos os projetos deverão ser analisados no plenário da Câmara nesta sessão, enquanto o texto-base segue para o Senado.
Mas, mesmo que o pacote seja aprovado, a percepção do mercado é que ele ainda não é o suficiente para estancar a crise das contas públicas.
“O pacote é medíocre e insuficiente. O governo vai ter que apresentar medidas adicionais para tentar reancorar as expectativas que foram desancoradas por conta do próprio governo. Ele criou a situação atual com uma comunicação truncada na apresentação do pacote, e foi uma grande frustração. Caso aprovado, parte do problema será endereçado, mas ainda falta mais”, diz Spiess.
A pressão afeta as curvas de juros futuros. O contrato para janeiro de 2026 subia de 15,08%, do ajuste anterior, para 15,49%. O de janeiro de 2027 ia de 15,415% para 15,94%; e a de janeiro de 2029 avançava de 15,12% para 15,59%.
Para conter parte do estresse, o Tesouro Nacional anunciou a compra e a venda de títulos públicos nesta semana. Serão três dias de leilões (18, 19 e 20 de dezembro), cujas condições das ofertas serão divulgadas nos dias de realização.
Para realizar essas operações, o órgão cancelou o leilão tradicional de títulos previsto para quinta.
Haddad, em falas a jornalistas nesta quarta, não descartou a possibilidade de que movimentos especulativos estejam promovendo a alta recente do dólar, mas disse acreditar que as intervenções do Banco Central e do Tesouro devem ajudar a acalmar os ânimos.
Na especulação, investidores procuram lucrar com a volatilidade de preços de um ativo, muitas vezes no curtíssimo prazo. Há também decisões tomadas por “robôs” (operações automatizadas), que dão impulso à volatilidade já aumentada.
“Há contatos conosco falando em especulação, inclusive jornalistas respeitáveis falando disso. Eu prefiro trabalhar com os fundamentos, mostrando a consistência do que nós estamos fazendo em proveito do arcabouço fiscal para estabilizar isso”, afirmou.
O ministro também lembrou que houve outros episódios recentes em que o valor do dólar apresentou altas. “Já houve dias tensos que depois se acomodaram em virtude do desdobramento das medidas tomadas pelo governo”.
Haddad também falou sobre o pacote de ajuste fiscal em tramitação no Congresso Nacional. Para o ministro, não haverá desidratação do projeto.
Já no exterior, os investidores repercutiam o corte de 0,25 ponto do Fed sobre a taxa de juros dos EUA, que veio exatamente em linha com as expectativas do mercado. Não foi uma escolha unânime: um dos diretores da autarquia votou pela manutenção da taxa.
O Fed ainda projeta que a taxa terminal de 2025 será de 4% —ou seja, que haverá apenas 0,50 ponto de redução.
“A decisão de reduzir as taxas hoje pelo FED não constitui uma surpresa. Mas, à luz das revisões das projeções, sugere que se tratou de uma redução que veio para dar aos mercados um pouco de conforto, uma vez que a Fed prepara o terreno para uma abordagem mais agressiva da política em 2025”, diz Seema Shah, estrategista-chefe global da Principal Asset Management.
A sinalização fez a moeda disparar globalmente, com investidores precificando um dólar ainda mais forte no próximo ano em meio às possíveis políticas econômicas do presidente eleito Donald Trump.
“O contexto econômico e inflacionista não pede um estímulo significativo, enquanto a nova administração poderá trazer um pouco mais de ‘dor de cabeça’ em termos de inflação no próximo ano. A tendência continua a de uma maior flexibilização monetária, mas, nesta fase, é claramente necessária cautela e paciência”.